A
terceira palestra do Cartório Talks, realizada durante o segundo dia do XXIV
Congresso da ANOREG/BR e VII CONCART, abordou o importante tema “Compliance
Tributária para a Eficiência dos Registros Públicos e Tabelionatos”, reunindo
especialistas de destaque para um debate fundamental sobre boas práticas e
gestão tributária no setor.
A
mesa foi composta por Alessandro Martins, auditor da Receita Federal do Brasil
e coordenador do GT Cartórios; Felipe Fleury, advogado tributarista e doutor
pela PUC-SP; Tiago Almeida, advogado tributarista e doutor pela PUC-SP e
Evandro Oliveira, diretor da LAE.
O
advogado tributarista e doutor pela PUC-SP destacou em sua apresentação como o
registrador e o notário podem ser eficientes do ponto de vista tributário. “O
tema tributário é fundamental, é um tema muito atual, que está no cotidiano do
notário e do registrador. Tentamos esclarecer as principais dores da atividade
e o que é preciso ser feito de forma prática”, disse Fleury.
Em
sua fala, o auditor da Receita Federal do Brasil e coordenador do GT Cartórios
destacou os avanços e desafios do Projeto Cartório, iniciativa que busca
fomentar a conformidade tributária no segmento. Durante a apresentação,
Alessandro Martins destacou a importância de uma relação colaborativa entre a
administração tributária e os contribuintes. “Não me sinto aqui no três contra
um, mas estamos tentando alinhar, de forma conjunta e não adversarial, a
questão da conformidade tributária”, afirmou.
O
projeto, iniciado há cerca de cinco anos, representa uma mudança no paradigma
do relacionamento da Receita com os Cartórios. A abordagem passa de uma visão
tradicional, pautada pela fiscalização punitiva, para um modelo que prioriza
orientação, transparência e monitoramento preventivo. Segundo o auditor, “os
autos de infração deixam de ser regra e passam a ser aplicados apenas quando
necessário”.
Um
dos principais pilares do projeto é o monitoramento. Em 2024, a Receita
intensificou o acompanhamento do setor, buscando identificar boas práticas e
corrigir irregularidades. Os resultados já começam a aparecer. Houve uma
redução significativa na emissão de autos de infração e um aumento robusto na
arrecadação voluntária. “A conformidade tributária do segmento se manifesta em
números. É muito gratificante ver esses avanços nos gráficos”, comentou
Alessandro Martins.
Ele
destacou ainda a campanha Seja um Cidadão Solidário, que incentiva a
destinação de parte do imposto de renda a fundos sociais. Ele chamou a atenção
para o potencial dos Cartórios nesse esforço: “A capacidade de destinação do
segmento em 2023 foi de R$ 146 milhões. Imaginem o impacto positivo que isso
pode gerar na sociedade.”
Já
Evandro Oliveira, diretor da LAE, ressaltou os desafios e as soluções para
alcançar maior eficiência e segurança nas obrigações tributárias dessas
serventias. Ele destacou o papel central da contabilidade especializada no
cotidiano dos Cartórios, muitas vezes negligenciado.
“Quero
agradecer à ANOREG pela oportunidade de falar sobre compliance tributário e
contabilidade em Cartórios, um tema pouco debatido, mas crucial”, iniciou o
palestrante. Ele lembrou que a contabilidade vai além do simples registro de
números. “Ela é uma ciência que interpreta e registra as mutações patrimoniais,
garantindo que a arrecadação seja feita da maneira correta. O contador não está
lá para minimizar a arrecadação, mas para assegurar que ela ocorra em
conformidade com a lei.”
O
especialista destacou que, no setor extrajudicial, a ausência de uma
contabilidade empresarial consolidada pode gerar confusões, especialmente no
que diz respeito à classificação de receitas e despesas. Ele exemplificou como
situações de repasses ou excessos podem complicar o cumprimento das obrigações
tributárias: “Hoje, não temos uma declaração específica que controle saldos
credores de um ano para outro. Isso gera problemas de interpretação e possíveis
prejuízos fiscais.”
Outro
ponto relevante foi a necessidade de escriturar corretamente o Carnê-Leão,
obrigação mensal que, segundo ele, muitas vezes é negligenciada. “O não
recolhimento na data devida gera juros e multas desde a data original, e isso é
algo que encontramos com frequência. É preciso mais atenção nesse aspecto”,
alertou.
A
interação entre as corregedorias de justiça e a Receita Federal também foi tema
do debate. Segundo ele, há uma grande confusão entre as prestações de contas
feitas para esses dois órgãos. “Despesas rejeitadas pelas corregedorias podem
ser aceitas pela Receita Federal. Deixar de aproveitá-las pode significar
prejuízos desnecessários para os Notários e Registradores”, explicou.
Ele
enfatizou a necessidade de buscar profissionais especializados para lidar com
essas questões: “No escritório, sempre fazemos uma revisão inicial da
contabilidade, e na maioria das vezes encontramos riscos fiscais desconhecidos
pelos próprios Notários e Registradores.”
“Procurem
profissionais capacitados e contem com as entidades de classe para avançar
nesse debate tributário e contábil. A segurança jurídica que vocês oferecem à
sociedade depende também da solidez dos seus números e da gestão tributária”,
concluiu Evandro Oliveira.
Impactos
da reforma tributária
“A
qualidade da assessoria contábil é indispensável para os Cartórios. Um bom
contador pode prevenir problemas que, de outra forma, resultariam em autuações milionárias”,
afirmou Tiago Almeida, advogado tributarista e doutor pela PUC-SP. Ele destacou
a complexidade da administração de serventias, que, embora geridas por
contribuintes pessoas físicas, operam com estrutura similar à de uma empresa.
Quanto
aos impactos da reforma tributária, entre as principais mudanças apontadas,
está a substituição do ISS (com alíquota máxima de 5%) pelo Imposto sobre Valor
Agregado Dual (IVA-D), que pode chegar a 27,5%. “Isso gera uma preocupação
enorme. Apesar de o IVA ser um imposto por fora, com possibilidade de repasse
ao usuário, inevitavelmente encarecerá os serviços notariais e registrais, o
que pode levar a um retrocesso na desjudicialização e incentivar a
informalidade”, alertou.
Ele
também mencionou a questão da não cumulatividade prevista na reforma. Apesar de
ser uma inovação, o princípio é quase inexistente para os prestadores de
serviços intelectuais, como tabeliães e Registradores. “Mais de 70% dos custos
dos Cartórios estão relacionados à folha de pagamento, que não é dedutível para
fins de crédito tributário. Isso torna o impacto da reforma ainda mais
preocupante”, explicou.
Outro
ponto destacado foi a ampliação da responsabilidade tributária de tabeliães e
Registradores. “Atualmente, o Código Tributário Nacional estabelece
responsabilidade subsidiária, ou seja, o contribuinte principal é acionado
antes de qualquer cobrança ao tabelião. Porém, o novo comando prevê a
responsabilização direta, mesmo que o erro não seja doloso. Isso é um absurdo e
coloca os Registradores em uma posição de auditores fiscais, o que não é função
deles”, criticou.
Encerrando
sua fala, o palestrante reforçou a importância de uma gestão fiscal estruturada
e de profissionais capacitados. “Mais do que nunca, é preciso investir em
assessoria contábil e jurídica qualificada. A meta é clara: evitar surpresas
fiscais e assegurar a sustentabilidade da atividade notarial e registral”,
concluiu.