O curso natural de uma relação que
chega ao fim é a busca pelo divórcio ou dissolução da união estável para que
surta seus efeitos obrigacionais, bem como pela partilha de bens, caso haja
patrimônio comum a ser partilhado.
Em alguns casos a resolução da questão
registral é mais urgente e prioritária, de modo que é possível que o ex-casal
realize em momento posterior a partilha dos bens comuns, como autorizado pelo
artigo 1.581 do Código Civil.
Seja por escolha do casal, por
morosidade ou complexidade do processo judicial ou pela necessidade de
realização de diligências diversas, a partilha de bens pode se prolongar e a
situação dos frutos deve ser analisada de forma minuciosa — inclusive para
evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes, a custas do empobrecimento
da outra enquanto os bens comuns não são partilhados.
Isso acontece, por exemplo, quando o
casal adquire um imóvel na constância da união, mas na ocasião do rompimento da
relação, um deles deixa o local e o imóvel que é dos dois passa a ser utilizado
exclusivamente por um.
Nessa hipótese, a propriedade do imóvel
será regulada pelas regras do condomínio até sua divisão com a partilha do bem,
aplicando-se a inteligência do artigo 1.319 do Código Civil [1] que estabelece
que cada condômino responde pelos frutos percebidos — vale lembrar que aluguel
de imóvel é fruto civil.
Assim, o Superior Tribunal de Justiça
[2] pacificou a tese de que mesmo que a partilha não tenha sido ainda realizada
"é permitido a um dos ex-cônjuges exigir do outro, a título de indenização,
a parcela correspondente à metade da renda de um aluguel presumido, se houver a
posse, uso e fruição exclusiva do imóvel por um deles". Em outras
palavras, quem permanecer em uso e gozo do imóvel comum, deverá ao outro
coproprietário o valor equivalente a metade do aluguel.
Importante esclarecer que esse valor
tem caráter indenizatório equivalente aos frutos devidos pelo uso exclusivo do
imóvel comum, não se confunde com o dever obrigacional da prestação de
alimentos. Esse último tem origem no dever assistencial, na solidariedade
familiar, está previsto no artigo 1.614 do Código Civil, devendo observar
trinômio alimentar para a fixação no montante, sendo certo que o conceito de
alimentos é amplo, podendo abarcar as despesas de alimentação, moradia, lazer,
transporte, educação etc.
Entendo que são institutos autônomos,
de natureza jurídica diferentes, portanto, cumuláveis. Inclusive porque, como
possui natureza indenizatória e não alimentar, a depender do caso concreto o
valor equivalente ao aluguel poderá ser pago ao final, quando partilhado o
imóvel, descontando do montante de quem usou e gozou do imóvel.
Entretanto, essa tese deve ser
imediatamente afastada nos casos de violência doméstica e familiar em que o
agressor é afastado do lar por ordem judicial face ao cumprimento de medida
protetiva de urgência.
Isto porque, a saída do agressor da
residência é medida imperativa e essencial à defesa da dignidade, integridade e
proteção da vítima, não constituindo enriquecimento ilícito. Esse foi o
entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, que em 2022 se
posicionou ao julgar o REsp 1.966.556 [3], sendo um importante precedente para
a defesa dos direitos das mulheres no âmbito do direito das famílias.
Há de se considerar que mulheres em
situação de violência doméstica em sua maioria estão em situação de
vulnerabilidade financeira, inclusive a dependência econômica é o segundo maior
fator que fazem com que as mulheres vítimas de violência doméstica e familiar
não denunciem seus agressores. É o que afirmam 46% das 3.000 brasileiras, com
16 anos ou mais, entrevistadas pelo DataSenado em 2021 [4]. A dependência
financeira dos parceiros só perde para o medo do próprio agressor ao
denunciá-lo, conforme 75% das entrevistadas sinalizam.